MANIFESTO DA EDUCAÇÃO:


Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão. Paulo Freire

terça-feira, 19 de abril de 2011

Bullying: alarmismo e medo

Passado o cruel assassinato de adolescentes no Rio de Janeiro, declarações veiculadas na mídia ligaram o fato a ataques de bullying sofridos por Wellington na escola, o que agravou o estado de alarde sobre o tema.
Tenho visto como brigas na escola passaram, facilmente, a ser temidas como possíveis atos de bullying. O uso indiscriminado do termo denuncia a dificuldade de reflexão sobre o tema pela incômoda ligação que a violência contida nos atos de bullying tem com as baixas origens da espécie humana, pois nenhum outro ser apresenta a capacidade e o prazer no maltrato e na imposição intencional de dor e sofrimento a si e ao outro.
A erradicação do mal mediante a classificação e a transformação em doença tem sido a forma, via ciência, que foi encontrada para nos distanciar de qualquer responsabilização frente aos atos humanos considerados indignos.
Os grupos humanos na economia, na política e na academia têm uma tendência a se diferenciar pelo patrimônio, pelo nível de poder alcançado e pelo saber acumulado. Na coletividade isso faz com que os sudestinos se acreditem mais importantes que os nordestinos. As zonas de consagração acadêmica e literária do sul-sudeste tendem a menosprezar os literatos e cientistas do norte-nordeste.
O fetichismo consumista estimula o ódio destrutivo tanto na paz quanto na guerra. A crueldade do indivíduo ou do grupo nas condições do narcisismo estimulado pela mídia torna-se um problema de saúde pública tanto no trânsito quanto na escola. A vestimenta ou a mochila do colega são signos de status que estimulam a ira narcísica de uns e a revolta ou submissão de outros. A maldade dessa situação é tanto maior porque as pessoas com menor poder aquisitivo entram em desespero para atender às solicitações dos filhos.
Por outro lado, como na hierarquia consumológica o saber é menos importante que a aparência, os grupos desenvolvem refinadas técnicas de falsificação e mentira. Os que não entram na vulgar jogatina são tidos como esquisitos e na escola são chamados de nerds. O verbo inglês to bully significa amedrontar alguém para obrigá-la a fazer algo. Assim, o grupinho narcísico inconsciente das suas próprias fantasias tenta enquadrar ou expulsar “o diferente” que se tornou incômodo. O problema desta engrenagem consumista é que não há como parar a máquina senão destruindo-a.
A situação limite implica que dentro do contexto capitalista é impossível por fim a tal loucura. O mecanismo é tão extraordinariamente desumano que impede a ligação afetiva entre as pessoas, ao mesmo tempo em que anula a capacidade crítica do pensamento humano. As imagens substituem o discurso que a escola e a academia tentam por em marcha. Desde cedo, as crianças são condicionadas para, no futuro, se tornarem consumidores compulsivos, meta ideal desta engenhoca terrorífica.
Os escolares divididos hierarquicamente em grupos narcísicos marcados por pequenas diferenças invejam os considerados superiores, enquanto desprezam todos aqueles imaginados abaixo da escala estatutária. A crueldade infantil estimulada cria nas crianças estúpidas desigualdades, enquanto a juventude em desespero encontra no crack e na cocaína a ilusão da felicidade.
No caso das crianças e jovens, a Lei tem sido uma saída quando os mesmos escapam à autoridade dos pais e da escola. Na legislação brasileira a gravidade de um ato pode levar um jovem a sofrer a ação de medidas sócio-educativas e os pais serem obrigados a pagar indenizações.
Penso que um cuidado efetivo com essa questão exige a compreensão das perversões e agressividades dentro do arsenal humano de possibilidades estando implicadas numa história subjetiva, individual e social.
Lembro, ainda, que rivalidades e antipatias fazem parte dos relacionamentos e que não podemos classificar todos os desentendimentos no âmbito da crueldade com o outro.
Não podemos resumir ao bullying a violência vista em Realengo. A gravidade do ocorrido exige um debate mais amplo sobre a condição humana e a nossa sociedade.
Que o bom senso nos livre de um policiamento politicamente correto como o que ocorreu na sociedade americana. Em que, em meio ao combate ao assédio sexual, até uma criança foi acusada por beijar um coleguinha do jardim de infância.


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Angela Alcantara
Jornalista

Petrópolis, a cidade das contradições

Petrópolis é uma cidade cheia de contradições. Ela parece ser habitada por uma infinidade de diferenças, como toda metrópole. Nela se destacam, porém, as diferenças sociais, pautadas principalmente no poder econômico. Curiosamente essa distinção não é tão percebida no âmbito do comportamento ante a coisa pública.
É na crescente privatização do espaço público que vejo uma homogeneização dos petropolitanos de todas as camadas sociais. É também nesse território que suponho que deva ser trilhado o caminho para alcançarmos, no futuro, condições melhores do que as enfrentadas hoje.
A precarização crescente dos nossos serviços públicos retrata bem essa super valorização do âmbito privado. Uma cidade que quer crescer e dar condições de vida digna a sua população não pode privilegiar os interesses privados, antes que o público.
A força das ações individuais não pode se sobrepor aos interesses mais coletivos. Isso, no entanto, tem formado parte do nosso cotidiano em diferentes setores da nossa cidade e termina por ser naturalizado como um fenômeno de toda metrópole. No trânsito, na saúde, na educação. Tudo aponta pelo rechaço ao público e ao endeusamento do privado. A disseminação da prestação de serviços públicos como algo ineficiente, não é mentirosa, mas é perversamente reforçada.
Essa compreensão difundida em larga escala na esfera política penetra de forma clara nas relações sociais cotidianas. Cada vez mais vemos os petropolitanos assumirem comportamentos personalistas no trato da coisa pública. Estacionamento em locais proibidos, furar filas, em diversas situações, até mesmo no atendimento da saúde, atirar objetos pela janela dos veículos, ouvir música na altura que lhe convém.
Cotidianamente os laços sociais vão se esgarçando e fazendo da convivência coletiva algo difícil de suportar. A diferença passa a incomodar. Analisada de fora, entretanto, a distinção não está no comportamento, mas em elementos que retomam, sobretudo, valores mais externos da observação do outro – signos de consumo, condição social aparente, dentre outros.
O comportamento, no entanto, é cada vez mais semelhante. O menosprezo pelo público e pelo coletivo é algo que ameaça a própria cidade, mas advém de qualquer setor ou classe social.
Petrópolis deve investir cada vez mais na criação de um modelo de organização pública com respeito às diferenças individuais e grupais, mas sem privilégios. Sem isso corremos o risco de chegar aos 200 anos como um aglomerado humano em detrimento de sermos uma cidade.

angelaalcantara@yahoo.com.brEste endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo. .
Angela Alcantara
Jornalista

Alunos agridem PMs e ameaçam professores

BRASÍLIA - O clima é de tensão no Centro de Ensino 4, em Guará, no Distrito Federal. Na última sexta-feira, um grupo de alunos agrediu policiais militares, depois de uma confusão em um ônibus escolar. Um rapaz teria sido retirado do ônibus, causando revolta em um grupo de estudantes, que agrediu os policiais. Dez alunos serão transferidos da escola.
- A informação que temos é que essas pessoas não são alunos e eles vinham junto com o ônibus. A gente não sabe qual o motivo, mas aparentemente é para passar droga - diz o tenente-coronel Eduardo Sousa.
Na segunda-feira, as aulas do turno vespertino foram suspensas. Professores se dizem inseguros e dizem que foram ameaçados. Nesta manhã, o policiamento foi reforçado, com duas motos, um carro e oito policiais militares. Estudantes fizeram prova e foram liberados mais cedo.
A Delegacia da Criança e do Adolescente ouviu nove estudantes envolvidos na agressão aos PMs. Três meninos e uma menina, entre 15 e 17 anos, foram levados para o Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje), por ameaça, dano ao bem público, receptação de produto furtado e resistência à apreensão.
- A maioria desses adolescentes já tem problemas, saíram de outros colégios e foram matriculados naquela escola - diz o delegado Nivaldo Oliveira da Silva.
Na tarde de segunda, um grupo de alunos estourou bombas em latas de lixo e um professor foi atingido por uma pedra.
- A polícia estava recolhendo os alunos nos ônibus e, no meio da multidão, uma pedra me acertou - conta o professor, que não quis se identificar.
Moradores do Guará também andam preocupados. Em três dias, eles colheram mais de 200 assinaturas num abaixo assinado que pede o remanejamento de alunos que vêm da Cidade Estrutural, localizada às margens da DF-095. Mais de 90% das vagas da escola são destinadas a eles.
- Acho que se tivesse uma divisão de alunos, o problema poderia ser sanado - fala o prefeito comunitário José Maria Castro.
Os alunos reclamam do preconceito com os moradores da Cidade Estrutural.
A aluna Kamila Santos, 17 anos, que mora na Estrutural, defende que nem todos que vêm da cidade querem confusão.
- Por mais que tenha muitos alunos da Estrutural, não são todos que participam da bagunça. Tem muitos estudantes que querem estudar, como eu e outros da minha turma - diz ela.
A regional de ensino do Guará informou que todos 364 alunos que estudam no período vespertino são da Estrutural. Desses, 29 alunos têm mau comportamento e já está decidido que 10 deles, considerados os mais problemáticos, serão transferidos para outras escolas do Guará.
A regional também informou que, a partir da semana que vem, só vão embarcar nos ônibus que saem da Estrutural os alunos que apresentarem uma carteirinha com foto. Essa decisão é para evitar que estranhos se encaminhem para a escola.
Medidas preventivas estão sendo discutidas pelo Ministério Público, Vara da Infância e Juventude, Conselho Tutelar, Polícia Civil, Batalhão Escolar, direção e professores.